19.2.25

Quimio 5/12

Ontem à noite decidi que hoje não ia usar nada a cobrir a cabeça. Usei uma camisola com capuz para que, caso tivesse frio, pudesse facilmente agasalhar-me um pouco. 

Saí do carro de cabeça descoberta e segui para o interior do hospital de dia. Notei alguns olhares, evitei essas pessoas. Andei a passar-me pelo rés-do-chão e 1.º andar, air pods nos ouvidos e segui a minha vida. 

Tive consulta de nutrição com o Dr. Edgar às 12:30. As análises estão ótimas, nomeadamente as plaquetas e a hemoglobina. Acho que são estes valores que costumam estar mais baixos e, no meu caso, está tudo ok. Vamos manter o que andamos a fazer. Os meus suplementos são Vitamina D e multivitamínico de manhã e Omega 3 ao jantar. Para além disso, faço colagénio ao deitar e alimento-me muito bem. Pode-se comprovar que estou bem roliça 🤭. 

Aguardei pela minha hora na quimio e admito que não gosto muito deste horário. Quimio às 13:30 e ainda estava em jejum. Eu pratico o jejum intermitente e, para já, estou a manter dentro do possível. Tenho muita fome e termino de comer já muito tarde, às vezes faço mesmo um lanche já depois do jantar. O que procuro fazer é mesmo saltar o pequeno-almoço. Mas tenho que tentar jantar mais cedo porque a questão do aumento de peso já me está a incomodar. Portanto, começar às 13:30 altera-me um pouco tranquilidade e levo petiscos comigo. 

Fui comendo o almoço que a minha mummy me preparou, enquanto aguardava que chamassem o meu nome. Comecei pela omelete simples num pão chapata e logo depois entrei.

Na chegada à sala dos cadeirões, os enfermeiros ficaram muito surpreendidos e entusiasmados por ter chegado com a cabeça nua. Eles já me conhecem das consultas e dos tratamentos e no último ainda tinha o meu cabelo. Disseram que ficava muito bem e deram-me os parabéns pela decisão e coragem. 

Dirijo-me ao meu cadeirão e hoje é-me atribuída outra enfermeira, que ainda não conhecia. Disse que o meu cateter era muito profundo e teria que usar uma agulha maior. Ninguém se tinha queixado disso antes. A colocação da agulha foi mais dolorosa que o normal, mas depois passou. 

Hoje, tinha ao meu lado uma senhora portuguesa, mas que nasceu no Brasil. O sotaque nunca o perdeu e foi a primeira vez que conversei com alguém ao meu lado. Habitualmente, dormem ou estão mais prostrados. Tem cancro nos ovários há mais de 10 anos, já removeu tudo, mas insiste em aparecer. É animada e otimista. Os pais são transmontanos, emigraram para o Rio, ela nasceu lá, mas entretanto resolveram voltar. Vem de Castro Daire. É longe. Ainda pensei que essa área pertencesse a Viseu, mas por algum motivo vem para Vila Real. Está a fazer a quimio vermelha e diz que se sente bem e que resulta muito bem para a situação dela. 

Desta vez fui 3 vezes à casa de banho. É incrível como os soros chegam rapidamente à bexiga. E lá vou eu até à casa de banho do corredor. Na sala das camas, onde fiz tratamento 2 vezes, há uma casa de banho interior e é mais cómodo. 

Comi a 2.ª sandes que tinha um bife maravilhoso e bebi um sumo de maçã. Entretanto, perguntaram se queríamos comer qualquer coisa e disponibilizaram sopa, sandes, bolachas, iogurte, chá… Eu já venho abastecida de casa, mas já aceitei noutras ocasiões. A minha cortisona não me deixa passar fome. 

Hoje acabei perto das 4. Nem percebo bem o motivo, até porque comecei mais cedo.

Cheguei a casa e fui direita à cama. A D. São já me tinha aberto a cama e deixou-me uma botijinha de água quente. A casa estava aquecida, mas os meus pés estavam frios. Que bem que me soube! Não dormi nem na quimio nem em casa. Já passa da meia noite e ainda estou acordada. Preciso de dormir mais cedo e estar ativa mais cedo. Vamos ver se amanhã é o dia.

Sinto-me muito grata por não ter dores nem nenhum mal estar de relevo. Hoje sinto-me como se estivesse embriagada e já sei que nos próximos dias me sentirei como se estivesse de ressaca. Faz todo o sentido e aceito as condições 😂. 

17.2.25

I feel good

Amanhã faço a 5a sessão de quimioterapia. Falando muito honestamente, não me sinto doente, não tenho sentido efeitos secundários de relevo e tenho conseguido fazer uma vida relativamente normal. 

A sensação que tenho é semelhante à que senti na gravidez. Tinha a informação de que estava grávida, mas não me senti grávida até às 18 semanas, quando senti a minha filhota a mexer na minha barriga. Até lá, confiava nas imagens das ecografias, já que não tive enjoos ou outras maleitas.

Agora é mais ou menos a mesma coisa. Nunca me senti doente, embora tenha sentido aquele nódulo. Informaram-me que tinha um tumor maligno. Os exames de diagnóstico que fiz causaram-me mais stress do que os procedimentos cirúrgicos. Nunca tive dor que não passasse com um paracetamol. 

Com a quimioterapia acontece o mesmo. Alertaram-me para os efeitos adversos, mas até agora só mesmo o cansaço e a queda de cabelo se manifestaram. 

Eu sei que ainda é cedo e que vai ser difícil, mas eu sinto-me mesmo bem. Não me sinto doente e não me comporto como doente. Não gosto de me vitimizar, mas permito-me parar quando estou cansada. Procuro manter-me activa e retomei o exercício na semana passada. Faço caminhadas sempre o que sol me convida e ontem até andei de bicicleta. Tendo em conta tudo isto, como posso reclamar? Sou muito sortuda, é o que sou.

A questão do cabelo começa a perturbar-me porque não sei como me apresentar em público com auto-confiança. Tenho saído com perucas, mas assim que chego a casa tiro-a. Não é confortável e sinto-me a usar um disfarce. Parece que está toda a gente a olhar para mim. Não gosto de usar gorros ou lenços sem cabelo porque associo sempre a cancro. Em casa, uso gorros porque é confortável, mas não gosto da imagem.

Amanhã, preparo-me para sair pela primeira vez sem nada na cabeça. Vou usar uma camisola com capuz, caso sinta frio ao sair do carro e assim protejo-me. Vai ser um teste a mim própria e nada melhor do que ir à quimioterapia assim. Lá não me devem achar uma alien. 





16.2.25

É só cabelo?

Não sabia qual seria o momento certo para cortar o cabelo, mas entretanto percebi. Ficou claro para mim quando estava a ser difícil controlar a queda de cabelo. Na terça-feira, dia 11, sem quaisquer receios, pedi ao Filipe que me rapasse o cabelo. A Maria Victória quis ver, a minha mãe não teve coragem.

Montei o tripé e pus o meu telemóvel a filmar. A miúda estava muito apreensiva e o Filipe perguntava se estava pronta. Estava, claro. Preparei-me para este momento há mais de 2 meses, quando suspeitei do pior. Prendi o cabelo em 2 partes e cortámos isso primeiro. E depois foi tudo de seguida. 

Sentir a superfície da minha cabeça sem cabelo foi uma sensação agradável. Mesmo. O pior foi mesmo quando senti a necessidade de ver o que estava a acontecer e pedi o telemóvel à MV. Fui surpreendida pela nova imagem e a emoção tomou conta de mim e permiti-me chorar. E vou permitir-me sempre que sentir essa necessidade. 

Preferia ter cabelo, mas não desgosto da minha imagem sem cabelo. Destaca muito os meus traços, as minhas imperfeições, o tempo que já passou por mim. O cabelo ajuda a distrair e a ornamentar. Dá uma moldura ao rosto e agora já não a tenho. 

Entretanto, ainda vou perder outras molduras: as sobrancelhas e as pestanas. E ainda assim continuarei a ser eu. Sou sempre eu.

Depois de cortar o cabelo, fui tomar banho. A sensação da água na cabeça é completamente diferente. É agradável, acreditem. O meu banho agora está reduzido a uns breves 5 minutos. Quem tem o cabelo tão comprido como eu tinha saberá que a rotina de um cabelo bonito demora o seu tempo. Acabou-se o champô, o amaciador, a máscara, o serum, o óleo, spray disto e daquilo. Tudo suspenso, para já, embora já me tenham dito que tenho que continuar a usar champô e amaciador. 

Arrependo-me de ter feito um corte de cabelo antes de ter começado a quimioterapia. Fiz uma franja para se aproximar mais das perucas que tinha pensado usar e cortei ao comprimento para me ir habituando. Não existe essa coisa do hábito. Não me habituei à franja e acho que essa falta de identificação até ajudou a que me quisesse livrar do cabelo definitivamente. 

No dia seguinte, tive que sair para fazer fisioterapia e ir buscar a MV ao colégio. Não me apetecia lidar com os olhares de pena ou de surpresa. Coloquei uma peruca. E no dia seguinte fiz o mesmo. 


Ao longo destas semanas, tratei de comprar várias perucas. Não são iguais ao meu cabelo. Acho que as perucas de cabelo natural são caríssimas. Consigo imaginar várias outras coisas que me trariam mais felicidade do gastar milhares de euros numa peruca que vou usar durante uns meses. Resolvi então comprar perucas sintéticas e brincar um pouco com a minha imagem. Se acho confortável? Não, não acho. Nota-se à distância que é cabelo falso e custa-me um bocado porque eu sou super a favor da naturalidade. Eu só pintava o cabelo, mas não gostava de usar pestanas falsas, nem mesmo muita maquilhagem ou filtros. Provavelmente, agora vou ter que me socorrer disso tudo. 

Em casa, procuro não usar nada. É como me sinto melhor, mas a simples movimentação de ar quando me desloco arrefece-me. Uso gorros, mas não gosto do que vejo. Continuo a preferir estar ao natural.


Fiz uma publicação com o vídeo acima nas redes sociais e foi este o texto que o acompanhou:

Não me considero uma guerreira, não me propus para uma guerra. Simplesmente, não tive escolha. Fui obrigada a enfrentar esta doença para salvar a minha vida e, nesse processo, aprendi que a validação da beleza não tem lugar quando a nossa existência está em risco. O cabelo ou a aparência nunca foram o que me define, e nunca me definirão. Não preciso dessa validação. A beleza e a juventude são efémeras e toda a gente sabe disso.

Mesmo quando confrontada com isto tudo, procuro cuidar de mim – tanto por dentro como por fora. Admito que me faz bem à alma olhar-me ao espelho e gostar do meu reflexo.

Os tratamentos que faço são extremamente agressivos, mas, felizmente, têm-se tornado cada vez menos prejudiciais para os doentes. A medicina avançou imenso no tratamento do cancro da mama e, quando detetado precocemente, há possibilidade de cura. Iniciei a quimioterapia branca, que tem sido bem tolerada, e, até agora, os efeitos colaterais têm sido relativamente leves – cansaço, aumento de apetite e, agora, a perda de cabelo.

A queda de cabelo não é um sinal de doença, mas sim de que o tratamento está a agir e de que me estou a curar. 

Faço questão partilhar a minha experiência porque eu procurei muita informação na primeira pessoa. Precisava de contactar com outras mulheres que tivessem passado pelo mesmo. Sei que, infelizmente, mais mulheres serão diagnosticadas com cancro de mama e que esse processo não precisa de ser aterrorizante e solitário. Para mim, apesar dos desafios, a experiência tem sido cheia de aprendizagens, mas tranquila, e serei sempre transparente, independentemente do que o futuro traga. Tenho a plena noção que com o acumular de tratamentos e com a próxima quimio vermelha os dias se tornarão mais difíceis. 

Para aquelas pessoas que quiserem saber mais detalhes sobre o meu caso e queiram encontrar informações que as possam ajudar, estou a documentar tudo no meu blogue desde o primeiro dia. O link encontra-se no meu perfil.

O objetivo foi mesmo poupar-me a comentários piedosos, mas eles apareceram na mesma. As pessoas continuam a pensar que eu estou preocupada com a minha imagem, e eu continuo a preocupar-me com a minha saúde. Aliás, quando comecei o tratamento, a pergunta que mais me faziam era “E o cabelo?”. Preferia que me tivessem perguntado como estava ou como me sentia. 

Honestamente, sinto que os comentários que me dirigem ou as perguntas que me fazem vêm do fundo dos seus próprios medos.  É o confronto com algo que lhes poderia acontecer e isso assusta. Não levo nada a mal. Mesmo. Mas magoa.

Há uns dias estive com uma pessoa que me cumprimentou, disparou um “Estás tão linda!” e virou costas. Claramente, não soube lidar comigo. E eu compreendo. 

Está tudo bem. Eu não sou só cabelo e posso continuar a explorar a minha feminilidade. Eu continuo a ser eu. 

13.2.25

Quimio 4/12


 
Esta está a ser uma semana bem desafiante, mas nem por isso difícil. Ao longo do fim de semana, comecei a sentir uma queda mais acentuada no cabelo. Nada que influenciasse o volume de cabelo mas entretanto começou a ser difícil de gerir a queda. Ao mínimo toque caíam muitos cabelos. Não é agradável. 

Na terça-feira apresentei-me para fazer a quimioterapia, mas fui mais ansiosa que o normal. A queda do cabelo estava a relembrar-me do que ia fazer. Mas cheguei lá, fui muito bem recebida.

Quando me começam a preparar para a quimio, eu olho sempre para o lado porque não quero ver e ficar sugestionada. Mas depois quero ver tudo. Desta vez, pedi se podia filmar e vi tudo depois de já estar feito. 


Tendo o cateter implantado este processo é super simples e poupa as veias dos nossos braços. Esta quimio que estou a fazer não ia causar danos às minhas veias, mas a vermelha que vou fazer a seguir é muito agressiva. A primeira semana com o cateter foi um pouco desconfortável mas agora nem me lembro que o tenho. Mesmo! 

Vim para casa com a certeza de que teria que rapar o cabelo. E fi-lo nessa mesma noite, mas fica para o próximo post. 

9.2.25

Fisioterapia

 



Esta semana comecei a fisioterapia para o meu braço. Já aconteceu tardiamente e tive que ser eu a pedir ao médico de família que me passasse uma requisição. Marquei consulta com a fisiatra no Hospital da Trofa na quarta-feira (que tem acordo com o SNS) e lá foram prescritas 12 sessões de fisioterapia.

Como já tinha sido confirmado pela Dra. Ana Sofia, formou-se no meu braço o cordão axilar. Isso não permite que mobilize o braço a 100%. Aliás, algumas semanas após a cirurgia, o braço inchou e mal o conseguia mexer, para além das dores intensas que tinha. Felizmente, como vem cá a casa uma terapeuta privada todos os fins de semana, fomos conseguindo gerir a situação. As massagens que recebia, bem como a drenagem linfática, ajudaram imenso. Mas eu precisava de mais, tendo em conta que o meu braço simplesmente não tem sistema linfático.

Comecei no dia seguinte, quinta-feira. A terapeuta Carlla é muito simpática e prestável. Começamos sempre por pressoterapia e depois fazemos drenagem linfática manual. 

Para já, fazemos 12 sessões, todos os dias, com excepção da terça-feira, que é quando tenho quimio. 

4.2.25

Quimio 3/12



O Dia Mundial do Cancro, a 4 de fevereiro, era para mim apenas mais um dia de sensibilização para a doença oncológica. 

Agora que eu também faço parte das estatísticas, viver este dia tem um significado muito diferente. 


Só ainda passaram 2 meses desde o meu diagnóstico, mas a minha experiência tem sido muito positiva, até agora. Até porque hoje faço o meu 3.º tratamento de quimioterapia e que sortuda sou por ter a possibilidade de o fazer. 


Ainda há um longo caminho a percorrer e espero que nunca me falte o ânimo e a coragem. 


Sou muito grata pelos os profissionais de saúde que me acompanham, pelos avanços científicos e pelas pessoas do meu coração que me dão as mãos e não me deixam passar por isto sozinha. Tenho mesmo muita sorte! 


O apelo que deixo a todos é que vigiem a vossa saúde. Mesmo! Um diagnóstico precoce faz toda a diferença.