21.3.25
Descida aos infernos
20.3.25
Quimio 9/12
1 - Insónias. Custou-me sair da cama e não quero meter-me em mais drogas do que as que já tomo. Tenho andado a tomar melatonina, mas já tomo tarde e consequentemente adormeço muito tarde. Tenho que acordar sempre às 7:30 para ajudar a MV a preparar-se para o colégio e já não consigo voltar a dormir. Têm sido vários dias com apenas 5 horas de sono e não lido bem com isso. Preciso de me disciplinar no descanso.
2 - O cadeirão é desconfortável. Apesar de dar para reclinar, tem outras funções que não estão operacionais. Dormir naquela sala não é fácil porque tem muita luz. Deveria ter trazido qualquer coisa na cabeça porque a sensação de sentir a pela da cabeça colar no cadeirão é muito desagradável. Mas estava tão cansada que, após os anti-histamínicos, dormi assim mesmo.
Hoje levei a manta e o tablet para continuar a ver a série Adolescência (ainda não acabei). Senti uma vontade enorme de falar com a minha filha e um medo de usar corações, já que desconheço a mensagem subliminar que cada cor tem. A adolescência dos tempos de hoje tem desafios muito perigosos e isso preocupa-me muito.
3 - Estava tão ferrada a dormir (apesar do desconforto) mas tive que fazer a escala habitual na casa de banho. Ganhei forças para me levantar porque uma senhora muito simpática da Liga Portuguesa contra o Cancro apoiou as mãos no braço da minha cadeira porque me queria oferecer um lanche. Agradeci e disse que já tinha comido porque eu vou sempre prevenida.
Entretanto, ela olha de novo para mim e pergunta-me se eu ainda não tinha ido lá acima (deveria estar a referir-se à associação Borboletas aos Montes) buscar uma peruca. Com a mesma simpatia, expliquei-lhe que tinha várias em casa e que eu gostava de não usar nada. Ficou um pouco desconcertada e afastou-se, compreendendo.
Eu sei que pode ser chocante andar com a cabeça nua. Mas já o é cada vez menos. Gosto de ter opções, até gosto de me ver de peruca, não gosto de me ver com outros acessórios, mas o mais confortável é não usar nada. Para mim, é assim. E já ando a ver novas perucas. Continuo a gostar.
4 - Ao fim de 9 viagens destas, isto já não tem muita graça. O cansaço e a impaciência instalaram-se. Será que isto nunca mais acaba? Admito que estou farta disto. Sinto-me mais fraca emocionalmente, com muitas dúvidas e acho que é normal. Este processo é muito longo, há margem para acontecerem muitas coisas e o estado de espírito não é linear. É preciso saber acolher esses momentos de incerteza e insegurança e, no dia seguinte, levantar a cabeça e seguir rumo à cura total.
5 - A desmontagem do material. Debaixo da minha pele está um acesso intravenoso para receber a medicação. Já falei aqui sobre isso. Desta vez, mostro como se retira. E é super simples porque é apenas uma agulha que fica instalada no tal acesso. E eu até tenho que colocar uma agulha maior porque aparentemente o meu cateter está muito profundo (ou seja, não é imediatamente debaixo da pele) e uma agulha maior é mais segura para que a medicação passe sem problemas. Não dói nada. O que mais me custa é tirar o adesivo porque faço sempre uma pequena reação.
16.3.25
Quimio 8/12
Na segunda-feira fui sozinha fazer as análises. Habitualmente, vai comigo, fica no carro e eu entro. Se houver necessidade, ela tira o carro. O estacionamento no hospital é reduzido e é mais rápido de deixar o carro à porta, sem dificultar o trânsito. Não afeta mesmo. E a mim facilita-me imenso. A minha mãe está doente e não me acompanhou. Não foi uma coisa rápida. Demorei imenso tempo na consulta de enfermagem, mas consegui falar com uma médica que me prescreveu uma pomada com corticoide para a alergia que tenho nos dedos.
No dia seguinte, fui fazer a quimio, mas antes tive consulta de nutrição. Não se acrescentou nada. Análises ok, peso como antes. Não vamos mudar nada porque não posso fazer dieta. Acredito que quando acabar a quimioterapia tudo voltará ao normal. O Dr. Edgar estava com 2 estagiários que ficaram surpreendidos quando me viram. Depois de verem a confiança com que me movo, ficam mais tranquilos e relaxam.
Sigo para a quimio. Business as usual, mas desta vez dormi. A insónia tem tomado conta de mim, por isso assim que me deram o anti-histamínico, adormeci. Não estava nada confortável. Prefiro as camas, aqueles cadeirões são desconfortáveis. Recusei o almoço que me ofereceram porque tinha levado um pão, banana e um sumo. Tinha mais sono do que fome. E rapidamente, o tratamento acabou.
Esta semana está a ser mais dura. Sinto-me cansada, mesmo cansada. Os treinos foram difíceis, como se o corpo não correspondesse aos meus comandos. Simplesmente não há força. A neuropatia também já se instalou. 3 dedos da mão direita e 1 ou 2 da mão esquerda já estão meio dormentes. Também já sinto algumas dores musculares e articulares. Não deve ser do treino porque nem foi assim tão duro. Hoje fui fazer uma caminhada, mesmo sentindo-me muito cansada, para tentar atenuar a fadiga.
E estou sem paciência para escrever. Adiei mesmo até hoje.
Efeitos adversos: insónia, fadiga, dores musculares e articulares, neuropatia.
8.3.25
Dias difíceis
Os dias que se seguiram à última quimio têm sido mais difíceis do que o habitual.
Não tenho dores de qualquer espécie, mas tenho uma inércia que não estou habituada a sentir. E eu sou bastante preguiçosa, mas isto é outro nível.
Tenho dificuldade em dormir, durmo pouco, mas também não tenho ânimo para sair da cama. Passei todas as manhãs na cama. Levanto-me para almoçar e volto para a cama ou o sofá.
O tempo não tem estado de feição para ir caminhar, por isso esta semana não fiz caminhadas. Se estivesse sol, talvez tivesse mais vontade. Fiz 2 treinos esta semana. Não me custou muito fazê-los, mas se tivesse que sair de casa para treinar, não teria ido.
Quando limpo o nariz sai sempre sangue, mas não chega a ser uma hemorragia. É dos anticoagulantes que me injetam durante a quimio. Pelo menos, as plaquetas ainda fazem a sua função.
A minha memória está pelas ruas da amargura. Falta-me vocabulário, tenho hesitações a conversar. Isto, sim, preocupa-me. Fala-se muito em chemo brain e brain fog. Tenho que perceber de que forma posso contornar este problema porque não estou a conseguir lidar com isto. Retomei as aulas de italiano para pôr a cabeça a pensar em algo novo.
Esta semana também bateu uma depressãozinha. Nunca me senti tão em baixo desde aquela altura em que aguardava o diagnóstico. Passaram 3 meses desde que isto tudo começou e estou a acusar o cansaço de quem ainda tem tanto pela frente. Perdi aquela pica de me livrar desta merda. Na próxima segunda faço análises, na terça faço o tratamento e é mais do mesmo durante mais 5 semanas. Estou farta!
O cabelo não cai todo, mas cai imenso e o que resta dele continua a crescer. Só deve cair completamente quando começar a quimio vermelha. Ainda falta mais de um mês. Passar a máquina na cabeça provoca-me borbulhinhas. Andar de cabeça nua faz-me frio. Não gosto de usar gorros ou chapéus na cabeça sem cabelo. Os lenços fazem-me lembrar a puta da doença.
Hoje pus a peruca mais parecida com o meu cabelo. Achei super estranho. Já não me revejo no cabelo comprido.
Estou cansada de tudo. Hoje perdi a paciência com as piadas do Filipe. Habitualmente sou eu que faço graças com a minha situação, mas cansei-me! Estou zangada por estar careca, por ter engordado, por ter a minha vida suspensa. Há tanta coisa que eu quero fazer e estou presa a isto, a lutar para ter uma vida melhor e mais longa.
O meu braço direito está a preocupar-me. Dói-me, está ligeiramente mais inchado do que o esquerdo. Ando a fazer drenagem manual a mim própria, mas tenho receio que fiquei assim para sempre. Ou pior, que inche de forma irreversível.
Tenho a sensação de que as minhas sobrancelhas estão a começar a cair. Só mais uma coisa a acrescentar à lista…
Ir-me abaixo é sinal de que tenho as emoções no sítio. Já estava a achar estranho estar sempre motivada e animada. Quem pode estar sempre assim num processo de cancro? Parecia que estava a dissociar-me do que me estava a acontecer, mas é bom olhar para as dificuldades de frente e voltar a enfrentar tudo com força.
4.3.25
Quimio 7/12
Ontem fiz quimio. Excepcionalmente não foi à terça, por ser Carnaval, por isso fui lá ontem. Estava uma autêntica feira porque devem ter passado tudo o que era de terça-feira para segunda e quarta. Esperei mais do que o habitual para ser chamada para as análises. Fui colher as análises na sala dos tratamentos e foi o enfermeiro que habitualmente está comigo que me recebeu. Pela primeira vez, colheram-me o sangue para análise através do CTI. Fizeram a preparação habitual e aplicaram-me o cateter externo de onde retiraram o sangue. Depois, fiquei já com o cateter colocado para fazer a quimio à tarde e poupei mais um furo no braço.