No final de setembro, estava eu a regressar de viagem do Algarve, recebo uma mensagem de uma amiga e colega de trabalho a pedir ajuda para rever um e-mail em espanhol. O e-mail era de uma amiga para um hospital espanhol e pediam informação sobre uma cirurgia a laser para tratar tumores cerebrais. O seu filho tinha sido diagnosticado com tumor no sistema nervoso central e era bastante severo. Havia também a possibilidade de um medicamento nos Estados Unidos, mas veio a informação que ainda não estava aprovado para humanos. Restava que algum hospital ou clínica o aceitassem para algum ensaio clínico. Tenho uma grande amiga que tem um laboratório no Instituto Einstein, em Nova Iorque, e pus a mãe do menino e a Renata em contacto. Logo a seguir, percebemos que ali não estava a resposta. A última esperança residia num tratamento na Alemanha. Precisávamos de traduzir os relatórios clínicos para Inglês com urgência. Tanto eu como a minha colega que me contactou com inicialmente somos tradutoras, mas aqueles textos eram quase ininteligíveis para pessoal não médico. Era impossível conseguirmos traduzir aquilo. Dado que conheço muitos médicos, pedi ajuda no Facebook para que alguém me ajudasse com a tradução. Responderam-me 2 pessoas. 2 pessoas, apenas. Fiquei desiludida, mas tive a ajuda que precisávamos. A pessoa que me responde nos 10 minutos seguintes à minha publicação foi a Paula. A Paula foi minha colega no ciclo e acho que já não a vejo pessoalmente há mais de 20 anos. Éramos muito próximas naquela altura, mas fomos para escolas diferentes e o afastamento foi natural. O Facebook tornou-nos novamente amigas, mas com pouca interação. A ajuda da Paula foi preciosa. Ela própria teve dificuldade em traduzir algumas partes e pediu ajuda a um colega que trabalhava no IPO. A tradução foi feita, mas o menino já não foi para a Alemanha. No fim de Novembro, a céu ganhou mais uma estrela. Os pais, família e amigos perderam um ser especial que ainda estava no início da sua vida - tinha 13 anos. A nossa contribuição foi tão mínima, mas acho que ajudámos os pais a tentar tudo o que estava ao seu alcance. Disso não se podem lamentar. A Paulinha que eu conheci com 10 anos tornou-se numa médica fantástica. Daquelas que não deixam de ser médicas só porque não estão no gabinete. Daquelas que se preocupam em ajudar, seja lá de que forma for. Quando soube da partida do menino, quis deixar uma palavra de gratidão à Paula. E ela presenteia-me com uma história que eu não conhecia. Pelos vistos, no 5.º ano, num teste, eu disse-lhe como se escrevia T-shirt. Ela nunca esqueceu e achou que me devia uma. Que ajudaria sempre, mas que estava em dívida para comigo. 30 anos depois pagou a sua dívida. Uma dívida que eu nunca cobraria porque nem sabia que tinha sido tão importante para a Paula. A vida é cheia de surpresas. Eu não conheço os pais do menino, mas penso neles muitas vezes. Acredito que este Natal seja bem mais triste, acredito que a vida deles e dos irmãos mudou para sempre. Gosto de pensar no privilégio que temos por partilharmos a nossa vida com outras pessoas, em vez de nos focarmos em como é difícil viver sem elas. Cada dia é especial e todos os dias podemos fazer algo de especial por alguém. Nunca saberemos a importância que terá para essa pessoa.
(Ainda devo uma palavrinha de agradecimento à minha amiga Renata. Acho que não a quis incomodar na sua bolha de amor - tem 3 filhotes maravilhosos (uma delas bebé) e acho que não precisava de saber que o menino não tinha sobrevivido)
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