17.11.22

A minha experiência num colégio privado

Os colégios privados podem até ser fantásticos para as crianças, mas eu já trabalhei num que era um verdadeiro terror para os professores.

Apesar de não ter sido muito traumático para mim, tive colegas para quem foi e muito. Consegui passar o ano lectivo sem meter baixa, mas tenho a certeza de que a passagem por lá deixou marcas.

Só falo agora disto porque a instituição já fechou e eu trabalhei lá há mais de 15 anos. E também porque me apeteceu.

Vou só contar algumas peripécias para verem o calibre do sítio. 

- Sempre que o colégio precisava de contactar um professor dava um toque para o nosso telemóvel. Deveríamos ligar de volta. Caso não o fizéssemos e atendêssemos a chamada, ela seria cobrada. Éramos mesmo chamados para pagarmos a chamada. 

- As aulas eram todas dadas de porta aberta. Não raramente ouviam as nossas aulas, mas às escondidas.

- Não havia funcionários, os chamados contínuos. Durante as aulas, um professor ficava em cada piso numa secretária no corredor, para qualquer eventualidade. O bar também funcionava com professores. Sim, os professores serviam alunos e os colegas professores. Durante os intervalos, eram também os professores que vigiavam os recreios e casas de banho. Sim, os professores. Havia escalas para isso. Os professores perdiam o seu próprio intervalo para fazer vigilância. 

- Caso houvesse algum dano material durante a supervisão de algum professor, era o próprio professor que pagava. Aconteceu-me chegar à sala de determinada turma e uma lâmpada ter fundido assim que acendi as luzes. Fui firme e recusei-me a pagar. Não teve tanta sorte uma colega minha que, durante uma vigilância nas casas de banho femininas, viu uma fechadura estragada. Teve que a pagar. 

- Fui uma privilegiada porque nunca tive funções nos corredores, no recreio ou no bar. A mim puseram-me a dar aulas de Inglês ao 1.º Ciclo - de graça e nem sequer me contabilizaram o tempo de serviço. Aposto que os paizinhos pagavam o Inglês, eu é que nunca vi nada. 

- Então, que funcionários trabalhavam na escola? 

- Professores para toda as funções.

- 2 pessoas na secretaria (que também era reprografia).

- 1 pessoa cuja função não consigo definir, mas era pessoa que nos dava toques para o telemóvel e trabalhava imenso.

- 1 Psicóloga.

- 1 pessoa que se passeava por lá com a psicóloga, cujas funções também não consigo definir mas pelas razões opostas - nunca a vi a trabalhar.

- Pessoal da cozinha.

- Pessoal de limpeza. É certo que estava sempre tudo muito limpinho, mas nunca lá vi ninguém a limpar. Provavelmente, alguém limpava fora das horas de serviço. Acredito que houvesse alguém a limpar. 

- A direção do colégio também convidava (ou intimava, como preferirem) o corpo docente para vindima. Enoturismo forçado.

- As reuniões de departamento eram uma comédia negra. A auto-designada delegada de departamento mandava-nos ler uma obra cujo assunto teríamos que discutir na reunião seguinte. Também preparávamos um tema gramatical para ser debatido. Eu sentia-me na escola primária de novo, só que o professor era um aluno da pré… A senhora era muito ignorante e levava autênticos bailes de conhecimento. O pior é que refutava tudo, sem argumentos válidos. Perdia todo o nosso respeito. 

- As reuniões de grupo já iam pelo mesmo caminho. A delegada do meu grupo propôs, por sugestão do direção do colégio, aplicar-nos um teste de Inglês. Só lhe disse que não havia ninguém naquela escola capaz de me avaliar e não fiz teste algum. Outros colegas de outras disciplinas fizeram-no e passaram pela humilhação de ver os seus resultados divulgados.

- As melhores reuniões eram mesmo as do Pedagógico. Pareciam rajadas de metralhadoras a serem disparadas por todos os professores. Raros eram os que se safavam.

Havia tanto mais para falar… Aquele ano naquele colégio proporciona assunto sem fim. Tenho a certeza que ainda vou voltar a este tema. 

Até porque também tinha coisas boas.



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